Uma pirueta, duas piruetas. Bravo! Bravo!

Queridas,

Este blog é fruto da minha trajetória, como aluna, na Fundação Escola de Sociologia e Política de SP (2010-2013).

A ideia foi compartilhar a integração entre angústia e aprendizado, que me acompanhou durante toda a formação. Imaginei que esse compartilhamento pudesse ajudar outras alunas(es) que eventualmente passassem por essa confusão de sentimentos.

A partir de 2013, os contextos sociais, políticos, ambientais etc., sofreram alterações significativas e este blog merecia atualização, mas não foi possível :(

Beijas,
Alê Almeida

Compro ego. Pago bem.

Sou preta, pobre, meio feia, moro longe e estou ficando gorda. Assim, fica difícil ter um ego que se preze.

Quando comecei a trabalhar com publicidade, tinha horror aos egos publicitários. Quem desdenha quer comprar. Eu olhava aquela gente marota, garbosa, faceira, cheia de molejo, e pensava “Quanta bobagem. O que importa é a criatividade. É mais fácil um camelo passar pelo buraco de uma agulha, do que um publicitário entrar no reino dos céus”. Tá bom.

Você, cara(o) amiga(o) publicitária(o) ou aspirante à tal, tenha um ego do tamanho do mundo, se não tiver, compre, roube, se vire, dê um jeito. O ego está para o publicitário, assim como o sutiã reforçado está para o peito caído.

Se você for freelancer, assim como eu, seu ego tem que ser em caixa alta, separado por hífens: E-G-O. Você até pode colocar no sobrenome. Alê Almeida E-G-O. Fica bonito.

Publicidade, web, design gráfico, mídia, tudo isso é muito legal. Eu gosto. Mesmo. De verdade. É um mercado muito concorrido, mas vira e mexe aparece um bicho-papão que, inexplicavelmente, tem uma conexão mental com pessoas portadoras de egos oriundos de Lilliput. Meu caso.

Já me deixei enrolar por amigo de infância, ex-professor e ancião. Não faço a menor idéia de quantos logos, papelaria, sites, apresentações e defesas eu já fiz em nome da amizade. “Ah Alê, eu preciso de uma marca para a minha empresa, você poderia criar? E um site, coisa pequena, é possível? Não quero atrapalhar, hein. É que eu preciso mesmo. Só não tenho como te pagar”, “Ah meu amigo, claro, pode deixar comigo”. Daí esse Judas, em pele de amigo, te indica para o bicho-papão.

O sujeito te liga do nada e diz com a maior intimidade “Oi Alê, aqui é o bicho-papão, tudo bem? Seu amigo, o Judas, me deu o seu telefone. Eu gostaria de conversar com você sobre um trabalho. Sabe, uma idéia que eu tive, coisa fina, especial. Podemos conversar?”. “Claro, pode falar”. Sou muito gentil. Fofinha.

“Descobri um ser vivo que possui penas e bico, acredito que seja uma ave. O mais incrível é que por onde sai o coco, também sai uma coisa em formato oval. Isso, oval. Ovo! Peraí! Anota isso. Se essa ave ficar sobre ele durante alguns dias, o Ovo vira uma outra ave, e se você pegar o Ovo antes que a ave fique sobre ele, ele é comestível, pode ser cozido, frito, mexido, entre outras maravilhas. Uma beleza. Coisa única. Para a ave dei o nome de Galinha. Peraí. Ovo de Galinha! Isso! Isso mesmo! Anota aí, “Ovo de Galinha”. Esse é o nome do produto. Agora você já tem o nome, faça o logo, a papelaria, a defesa, pesquisa de mercado, apresentações diferenciadas para cada público, divulgação através de newsletter, crie um site. Só que não há verba, você precisa acreditar. Esse é um produto novíssimo. Será a última moda. Você ganhará rios de dinheiro. Ah, é para ontem”.

O meu ego, em caixa baixa, faz com que eu dê graças ao Senhor por ter trabalho. Assim, pouco importa o dinheiro. Sou romântica. Agora, se eu tivesse um E-G-O, em caixa alta, separado por hífens, não seria assim. Para começo de conversa eu seria marota, garbosa, faceira e cheia de molejo. Portanto, dificilmente, seria abordada com uma conversinha dessa. Porém, se o bicho-papão fosse um sujeito com muita coragem e me abordasse, eu o olharia com nojo, afinal eu seria, infinitamente, melhor do que ele. Daria aquela risadinha de desdém, sobre a sua idéia de jerico. Faria uma cara de “yo no hablo su lingua”, quando ouvisse “não há verba” e me teletransportaria para o Olimpo ao ouvir “você precisa acreditar”.

Confesso que aprendi muito com todos os bichos-papões que encontrei nessa vida. Sobre trabalho, inclusive. Nada é todo ruim. Mas, não abrirei mão da caixa alta no meu futuro ego.